Calem-se!
Calem-se, por favor, calem-se.


Se não têm nada a dizer, calem-se.
Para falar por falar, calem-se.
Ouçam. Ouçam mais. Ou então não ouçam. Mas calem-se.


Já não aguento mais as vossas conversas de ocasião, as vossas propagandas baratas, as vossas reflexões rotineiras. É pior que a conversa da meteorologia.
Não. Não. Não não não, não quero saber quantos grãos de arroz comeram ao almoço, nem da chatice que foi o trânsito, nem dele se tem a camisa dentro das calças, nem dela se fuma com o cigarro acima da cabeça, nem dos anjinhos, nem do preço da uva, não.
Não me contem a história da vossa vida, se não têm histórias nela.


Eu não falo. Tenho ainda poucas histórias. Ouço. [Às vezes, escrevo. Mas isso não conta, porque não escrevo-grito aos vossos ouvidos. Vem, se quiseres.]

Silêncio!
Silêncio, por favor, silêncio.


Experimentem.

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[suspiro.]


Porque são o silêncio e a solidão tão insuportáveis para vocês?
Ficam com comichão na nuca? Ou arrepios como a esferovite e o giz no quadro? Dói-vos aqui bem no meio do peito? Dói, pois dói. Essa dor aí bem no meio do peito, essa dor és tu. És tu, sem distracções de conversas de ocasião, sem propagandas baratas, sem reflexões rotineiras. És tu, em silêncio e só.
Agora, lida contigo! É lixado. Começas a pensar e ui aí é que é. É já ali a janela, se quiseres. 3º andar. Se calhar só dá para uma conta chata no hospital. Pena a botija do gás estar a acabar. Só tens aspirinas, brufen e a pílula do gato, esquece, não chega.
Podes beber um copo, se ajudar. Põe música – o silêncio vai continuar lá – mas põe o volume alto. Ouve tudo, pensa tudo, sente tudo, porra!, estás vivo, sabes?
Depois, chora o que tiveres a chorar e mais se for preciso, ri dança histericamente, lê, escreve, pinta, pensa. Ou nada. Não faças nada. Fica pára e deixa vir tudo o que vier. Mesmo que não venha nada.


Mas não. Já estás a pegar na tecnologia xpto e a escrever mensagens existenciais ao mundo: “alguém aí?” (não, eu não estou para ti.)
Não suportas isto. Não te suportas.
Vai, então. Mas não fales comigo. Cala-te, por favor, cala-te.

2013.
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